Pesquisas recentes, com contribuições significativas da Universidade de Bordeaux e da Universidade de Michigan, sugerem que os Neandertais possuíam uma dieta mais diversificada e engenhosa do que se acreditava anteriormente. Longe de serem apenas consumidores vorazes de carne fresca, evidências apontam para a inclusão de larvas de moscas como um componente nutricional importante. Essa descoberta ajuda a explicar um antigo mistério científico sobre seus níveis elevados de nitrogênio-15, que por décadas levaram muitos cientistas a classificar os Neandertais como "hipercarnívoros", uma dieta que seria fisiologicamente improvável para humanos devido ao risco de "inanição por coelho" (desnutrição por excesso de proteína magra).
Uma hipótese pioneira, articulada pelo antropólogo John Speth da Universidade de Michigan, propôs que os altos níveis de nitrogênio-15 poderiam ser explicados pela ingestão de carne em decomposição, que frequentemente continha larvas. Para testar essa ideia, a antropóloga Melanie Beasley, da Purdue University, realizou estudos experimentais com tecidos humanos em decomposição e as larvas que neles se desenvolviam. Seus achados, publicados na revista Science Advances, demonstraram que as larvas de moscas apresentavam níveis de nitrogênio-15 drasticamente mais elevados do que o próprio tecido em decomposição, sugerindo que a inclusão de larvas na dieta teria um impacto substancial na assinatura isotópica encontrada nos restos de Neandertais. Essa descoberta oferece uma explicação plausível para a aparente contradição entre os altos níveis de nitrogênio-15 e a incapacidade humana de sustentar uma dieta puramente hipercarnívora. As larvas, além de serem uma fonte rica em gordura e proteínas, poderiam ter "pré-digerido" a carne, tornando-a mais nutritiva e fácil de processar. Essa prática de consumir carne envelhecida ou em decomposição, por vezes infestada de larvas, era documentada em relatos etnohistóricos de povos indígenas do Ártico e de outras regiões, que frequentemente consideravam tais alimentos uma iguaria. Paralelos históricos e culturais, como o queijo Sardo Casu Marzu, que contém larvas vivas, demonstram que a ingestão de insetos e produtos fermentados não é estranha a diversas tradições culinárias. A pesquisa, que também envolveu a Universidade de Bordeaux, não apenas redefine a compreensão da dieta Neandertal, mas também destaca a notável adaptabilidade e engenhosidade desses hominídeos na utilização de recursos disponíveis em seu ambiente. Ao invés de serem meros predadores, os Neandertais demonstram ter possuído um conhecimento sofisticado sobre como maximizar o valor nutricional dos alimentos, mesmo aqueles que hoje consideraríamos pouco palatáveis.